sexta-feira

A solidão


A Maria Henrique tinha ido para a Universidade este ano. Sempre tivera boas notas. Aluna aplicada, trabalhadora, esforçada, mesmo. Parecia quase sempre querer provar alguma coisa a alguém. Qualquer pequeno deslize lhe soava a derrota. Era preciso sempre lembrar-lhe que era capaz e mostrar-lhe o que era tão evidente, o seu sucesso. Mesmo assim nada a satisfazia.
Sofia sentia que lhe faltaria sempre algo. Alguma palavra, algum conforto.
Sabia que apesar de todo o esforço não pudera ser nem preencher as lacunas na vida da filha. Desejara-o mas sabia-o impossível.
Júlia chegou a chamar-lhe mãe canguru. Agora a bolsa, se alguma vez a tivera, de nada lhe servia. Maria saíra de casa pela primeira vez.
A principio foram as chamadas constantes., as visitas assíduas… os medos e tantas saudades. Um mundo novo. A casa vazia.
Foi tão difícil para Maria como foi para Sofia. De forma diferente. Mas com a mesma intensidade.
Só com a chegada da Primavera despertam e percebem que a vida continua para as duas em sítios diferentes, com objectivos diferentes mesmo continuando a fazer parte da vida uma da outra. O cordão umbilical começa agora a dar de si. Ainda sem corte mas com mais liberdade e permitindo espaços mais abertos e mais ousados. Como se pudessem viajar e sentissem que acontecesse o que acontecesse o porto de abrigo estaria sempre por lá. À espera, tranquilo, sem datas nem horários.
E talvez esta solidão fosse a ponte para novas travessias que a idade ajuda a fazer. E talvez a idade ajude a construir pontes sozinho com mais segurança. E seja preciso crescer, estar sozinho para avançar, ir mais longe, ser maior, pensa Sofia, suspirando baixinho.

2 comentários:

  1. Pois é...
    "as dores de parto nunca acabam,
    só mudam"

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  2. Anônimo20:29:00

    Achamos sempre que não fizemos tudo na vida dos nossos filhos....... E quando os laços se deslaçam ficamos meio perdidos como se a longura dos espaços que se impoe entre nós e o que amamos pudessem ser a chave que nos fecha dentro de uma solidão procurada mas tv nunca desejada.

    Ana Luar

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